domingo, 26 de agosto de 2012

He is back


       Abriu a porta. Não estava trancada, como havia previsto. Adentrando a sala, percorreu todo o aposento com os seus olhos insones, que nesses últimos dias andavam abertos, passando noites em claro, com a mente a trabalhar de forma ativa, em um elaborado e contínuo trabalho de reflexão. Sentou-se em uma cadeira, cadeira esta que costuma acomodar seus ilustres hóspedes. Colocou a mão no queixo e ficou assim por algum tempo, imóvel, mais uma vez entregando-se à laboriosa atividade filosófica que apesar de um tanto cansativa e às vezes angustiante, tinha a sua cota de prazer.
       Então, deu um sorriso discreto e levantou-se. Olhou para as escadas que levavam aos seus aposentos e calmamente subiu, degrau por degrau.
       Ao chegar em sua alcova, notou que a porta estava escancarada. Não se importando com isso, adentrou o recinto e meticulosamente, passou a chave, trancando-se e mais uma vez isolando-se do mundo exterior. Observou a escrivaninha: havia um pouco de poeira, assim como um pouco de cinzas no porta incenso. Os papéis que havia deixado de forma ordenada não mais desta forma estavam. “Então estiveram aqui”, pensou e sorriu mais uma vez, só que o novo sorriso foi um pouco mais amplo que o de antes. Arrumou seus papéis, acendeu as velas no candelabro, pôs um incenso de benjoim, pegou da caneta, algumas folhas em branco e começou a escrever. Sentiu que estava a faltar alguma coisa. Então pôs Chopin para tocar. Agora não faltava mais nada.
     Era notório o modo com as ideias estavam a fluir em sua mente. Não era algo que se destacava em qualidade, todavia a qualidade delas era superior ao que era outrora. Também estava a saborear uma sensação de liberdade plena, que nunca havia experimentado antes, não com essa satisfação e com essa intensidade. Seu ser encontrava-se agora renovado, mais do que nunca. Sua viagem filosófica e metafísica obteve esplêndido êxito, mais até do que ele poderia imaginar. A grande maioria de suas dúvidas havia se dirimido e as brumas de sua ignorância não estavam tão densas quanto antes: a visibilidade agora estava melhor. Sem dúvida, foi uma ótima decisão o seu exílio intelectual.
     Agora, era só colher os frutos dessa colheita e continuar trabalhando para que essas brumas não fiquem mais densas e consequentemente dissipem-se de forma definitiva. 

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