Boa noite, meus caros amigos! Sejam bem vindos! Bela noite de lua cheia, não acham? Que tal ficarmos aqui fora e aproveitarmos esse belo plenilúnio? Boa ideia, não acham?
Hoje apresentarei aqui o 1° capítulo do romance que estou escrevendo, chama-se "Metáphisique". Gostaria de ouvir vossa opinião sobre minhas habilidades em escrever prosa, já que não tenho tanta experiência nesse ramo. Ontem eu terminei o capítulo XIII. Também estou com um projeto de um livro de reflexões filosóficas, livro esse que está sendo escrito aos poucos e um romance utópico, que irá falar sobre uma sociedade perfeita em que as pessoas tem bons valores e valorizam a verdadeira arte.
Dadas as explicações, vamos ao texto:
Cap I
Au revoir
Mais uma vez encontrava-me no interior
daquela suntuosa e nívea sala. A mobília mais uma vez fazia-me ter um orgasmo
estético, assim como o restante da decoração: os castiçais, os quadros, a
escrivaninha e tudo que a ornava de forma que ela fosse um simulacro do Olimpo.
Por muito tempo senti-me um deus ao residir aqui neste palácio mágico que por
anos fez-me viver uma ilusão poderosíssima, fazendo-me crer que de fato eu
pertencia a este lugar. Hoje, com a magia quebrada, vejo que a realidade é
outra completamente diferente. A questão que permanece é se esse encanto pelo
qual vivi sob jugo por tanto tempo foi de fato efeito desta morada ou foi algo
que impus a mim mesmo. Bom, acredito que isso não fará muita diferença agora
pois neste momento percebo que esse nunca foi o meu lugar. Agora que olho para
mim mesmo e vejo meu sobretudo negro, meus longos cabelos escuros, minha pele
bronzeada e meus olhos castanhos... como pude viver por tanto tempo iludido?
Foi preciso um grande ferimento que quase causou minha morte para fazer-me
despertar deste sonho maldito no qual estive por tanto tempo. Eu sou a antítese
desse lugar!
“I’m a creep, i’m a weirdo
What the hell am
I doing here?
I don’t belong here”
Radiohead, “CREEP”
Desperto de meus devaneios ao ver aquela alva figura aproximando-se de
mim. Estava linda como sempre foi. Usava um lindo vestido branco que cobria
todo o seu corpo, privando-me da visão de sua pele. Os seus longos cabelos
dourados e flamíneos estavam soltos, emulando uma enorme cascata de ouro
líquido cujo valor era inestimável. Seus olhos azuis estavam a fitar-me de uma
forma que nunca vira antes. A forma como olhava-me com aqueles olhos fez-me
descobrir o que tinha para dizer antes que os seus lábios movessem-se com a
intenção de proferir as palavras desejadas. Então, com aquele seu caminhar
peculiar aproximou-se de mim, parando por alguns instantes. Olhou para o chão,
depois olhou para o meu rosto. Senti que ela tentava em vão saber exatamente o
que eu sentia naquele momento, como se tentasse ler minha mente. Na verdade se
a ela pudesse ser concedido algum desejo, não tenho dúvidas de que ela
escolheria o dom de ler mentes somente para desvendar os mistérios de minha
melancólica alma. Alma, mente... alguns dirão que são coisas diferentes. Bom,
para os franceses é exatamente a mesma coisa, tanto que eles usam a mesma
palavra para denominar os dois, Espirit. Já aqueles que usam a língua
inglesa usam duas palavras, assim como nós: soul e mind,
respectivamente. Mas acredito que não cabe a mim tentar enveredar-me pelos
mistérios das mais diversas línguas para descobrir quem de fato está com a
razão. Isto não elucidaria o problema, muito pelo contrário, dificultaria ainda
mais a questão e faria com que se tomasse outro caminho que conduziria para
longe da estrada principal. Aliás, é o que está acontecendo neste momento.
Retornemos então à estrada principal, visto que essa para qual eu os conduzi é
por demais oblonga e maçante. Pardon moi.
Depois de algum tempo fitando-me os olhos, ela deu um
suspiro e perguntou:
- Esta é tua decisão final? Irás partir?
- Sim, estou certo de minha escolha.
Quando disse isso, senti um calafrio
percorrer todo o meu corpo. Acredito isso ser um fenômeno bastante comum,
levando-se em conta que nunca pensei em articular tal sentença. Creio ser isso
o que chamam de angústia mas não uma angústia qualquer; é algo assaz esmagador,
como se fosse um monstro criado pela mais maligna das entidades divinas apenas
com a intenção de lacerar a alma de suas vítimas. Acrescento aqui que naquele
exato momento eu sentia que aquilo era apenas o princípio de uma dor que com o
passar dos dias tornar-se-ia cada vez mais insuportável, a ponto de fazer-me
desejar ter um encontro precoce com Tânatos. Desculpem-me se pareço ser muito
dramático ao usar essas palavras. Contudo foi exatamente assim que interagi com
a realidade naquele momento, tudo que consegui perceber era a desgraça que se
abatia sobre meu ser.
- Podes visitar-me se assim desejares.
- Isso não ocorrerá. Não há motivos para
minha permanência aqui, mesmo que por apenas alguns instantes. Não há sentido,
bem o sabes.
-Sempre foste deveras dramático- ela
disse, esboçando uma expressão de desdém.
-Estou apenas sendo realista.
Assim falei porém sentindo-me como uma
vela que luta para permanecer acesa enquanto o vento sopra forte após abrir com
violência as janelas de uma suposta residência.
-Tua luz antes iluminava meu caminho,
agora apenas me ofusca.- continuei, rompendo a barreira de silêncio que havíamos
criado entre nós.
- Vejo que não voltarás atrás em tua
escolha. Nunca foste de fazer isso. Então isso é um adeus definitivo...
Não respondi, apenas dirigi-me em direção
à porta que conduzir-me-ia para fora daquele cômodo cuja luminosidade começava
a incomodar minha pessoa. Mesmo não olhando para trás pude perceber claramente
que ela estava seguindo meus passos. Cruzei a porta e continuei a caminhar.
Então notei que ela não mais me seguia, havia parado na frente da porta e
permaneceu estática a me observar. Parei de caminhar e fazendo um movimento com
o pescoço virei minha cabeça para trás, mas não totalmente, não formando um
ângulo de 90 graus como esperado de um movimento desse tipo. Fiz desta forma
pois o objetivo não era olhar dentro dos olhos dela e sim apenas ser cortês.
Sabe-se que para falar com alguém, se não desejas olhar nos olhos daquele com
quem vós falais, ao menos esteja de frente com este.
-Adeus, minha cara. Se um dia tornarmos a
nos encontrar, que seja de forma breve e indolor para ambos.
-Adeus.
Essas foram as últimas palavras que
dissemos um ao outro.
Logo após, continuei meus passos em
direção à saída de seu castelo. Agora ela havia tornado-se a proprietária única
já que não fiz questão de pedir a minha parte. Caminhando pelo pátio, vi que
acabara de anoitecer e a lua nova exibia um sorriso sarcástico, provavelmente
destinado a mim. Notei que meus passos vacilavam, não conseguia caminhar em
linha reta, era como se estivesse ébrio após ter ingerido a mais entorpecente e
amarga das bebidas. Interessante notar que os portões já se encontravam
abertos, os criados já tinham poupando-me do trabalho de abri-los. Criados...
nunca fiz questão de tê-los. Confesso que eram úteis e tinham boa vontade mas
não era algo indispensável para mim, salientado o fato de que sempre fui
bastante independente. Ao contrário dela. Inclusive muitas vezes ela sentia-se
muito orgulhosa em tê-los, era frequente o tom de soberba em sua voz ao
dirigir-lhes a palavra. Nunca tratou-os mal, é verdade. Aqui devo ser justo e
não tentar pintar um retrato de uma nova Catarina a grande, injusta com os
menos favorecidos. Ela sempre os tratou bem, embora gostasse da sua condição de
superioridade perante os mesmos.
Foi nesse momento que notei que estava a
pensar por demais e decidi obliterar os pensamentos ridículos que insistiam em
apossar-se de mim e cruzei aqueles portões de forma derradeira.
... sem olhar para trás...
O personagem principal, que não tem nome, ou melhor, ele não é dito durante o romance.